O espelho tem olhos vermelhos. O carro desliza na chuva.
Recosto a cabeça no banco. E me deixo ir. E te deixo ir. Piscam teus olhos e o
semáforo apressado. Passa por nós tão rápido quanto a noite durou. Enquanto eu
balbucio uma canção que me possa ser. Porque estou cansada. Muito longe do
início do jogo. Minha língua é o sinal que ela dá. Seu discurso condiz com o
que o corpo conduz? Eu estava sozinha quando o eco gritou “eu também”? Quais
eram mesmo as palavras? Só me lembro do que senti. A parede também tremeu. Não rememorei as cenas,
eu juro. Elas voltaram por si próprias, sangrando. Tão vivas quanto antes. Tão
vivas quanto ontem. Quanto você nos meus braços, ofegante. Refletindo minha
expressão, como quem sente o mesmo prazer agudo sem ser penetrado. Lambendo
minhas feridas com a janela aberta. A chuva não desfaz o fogo. Molha a rua. Abro
os braços. Como quem não sente medo, porque já perdeu. Porque nunca teve. Como
quem não sente dor e dá a outra face. A outra pele. Todas. E você entra. Eu não
seria tão sádica de te falar dessas bobagens quando você precisa dormir. Não
tanto quanto masoquista pra senti-las até perder o sono. Ficou em algum ponto
da estrada. Talvez num quarto barato. Talvez num barato sóbrio. Uma embriaguez
lúcida. Um sorriso sério. Um sarcasmo inédito para perguntas retóricas.
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