sábado, 4 de maio de 2013
"Eu discordo!", esbravejou Justine, apertando com força a taça de cristal que um dia conseguiu contemplar sorrindo sem saber ao certo o porquê. Talvez por ser ainda mais velha que as quatro paredes rachadas que rodeavam a vida ali. Ou por ser a única coisa que, depois de tanto tempo, ainda conseguia brilhar. O eco de suas duas palavras desfez um nó que há muito havia prometido eternidade. Era sua última frase. De fato, nenhuma a mais se fazia necessária.
"Eu discordo!", Lucas repetia para si todas as noites. Era como se pudesse ouví-la dizer que “talvez ele mesmo já consentisse aquele dia a dia hostil e tudo bem também se o resto do mundo já não tinha nada a ver com isso: para ela, todos aqueles pontos de sangue e cristal no chão significavam um ponto apenas. Ponto final.” E que queria dizer discordar? Que estranha força tal palavra possuía para ser capaz de arrancar violentamente Justine do silêncio, do medo e de Amadora? Às vezes, durante as sucessivas madrugadas eternas sem ela, a chuva caía tão insistentemente que parecia querer sussurrar-lhe a resposta. Nessas horas, Lucas tentava simplesmente dormir. Sonhou que não tão longe dali, lágrimas e suor se fundiam no corpo de Justine. Um dia, não conseguindo visualizar um futuro convidativo onde estava, ela se deu conta de como adorava ser sua pior inimiga, alimentando as torturas mais terríveis, como se desejasse saber até que ponto sua alma aguentaria a pressão sem se deixar esmagar, como fizeram os sonhos. Os anos. A taça de cristal. Talvez, pensou Lucas, nessas e em outras horas, imersa na mais profunda urgência de fuga, Justine, como ele, desejasse apenas dormir.
18-09-2012
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